terça-feira, 6 de novembro de 2012

Bertha Becker: de "Tigresa de Haifa" a "Jaguatirica de Ponta Porã"


A geógrafa Bertha Becker, 80 anos, pesquisa a Amazônia há 40 anos. Começou levando alunos do Instituto Rio Branco, onde dava aula, no início dos anos 70. Ficou tão fascinada que ao se tornar professora do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), dedicou seu tempo a estudar a região.
O Razão Social publicado hoje traz uma entrevista em que ela faz uma análise sobre o desenvolvimento da região. Por questões de espaço não foi possível publicar na íntegra. Abaixo segue a continuação da conversa que tive com ela, na qual conta algumas histórias que viveu nas viagens e revela seu novo projeto de trabalho.

O GLOBO - A senhora ainda viaja muito para a região?
BERTHA BECKER - Faço inúmeras viagens por ano. Prefiro ir e avião e viajar por lá de carro. Fico geralmente em pousadas precárias, muitas vezes com bichos, mas é o que tem. Já me acostumei.

O GLOBO - Imagino que nessas viagens a senhora viveu muitas histórias. Conte uma delas.
BERTHA BECKER - Sou judia e no Instituto Rio Branco costumavam me chamar de "Tigresa de Haifa" porque eu sempre fui muito "briguenta" e exigente. Quando comecei a ir para a Amazônia levar os alunos e
criava confusão porque ficava indignada com os desmandos que faziam na floresta, eles começaram a me chamar de "Jaguatirica de Ponta Porã". Pegou. Sou conhecida também por este apelido. Há uma outra
história que gosto de contar porque ilustra bem o que o pesquisador que estuda a região pode viver em suas andanças.
O GLOBO - Que história?
BERTHA BECKER - Estava em Itaituba, lugar de descoberta de ouro. Fui com os alunos conhecer Fordlândia, cidade linda com arquitetura inglesa, uma maravilha. Fomos de barco, pelo Rio Tapajós. No caminho vimos que uma festa iria acontecer mais tarde em uma área ribeirinha. Seria a inauguração de um novo distrito bem na baira do rio. O barqueiro ficou todo interessado, mas seguimos viagem até Fordlândia. Quando voltamos, bem próximo ao local da festa, o barco misteriosamente quebrou. O barqueiro logo disse que demoraria para consertar. Eu pedi então a todos que remassem com as mãos até o local da festa, já que não teria outro jeito. Ficamos lá a noite toda, junto com o prefeito de Itaituba, garimpeiros do Maranhão e vários políticos do Rio Grande do Sul, naquela época os novos donos da região. Eu e meus alunos caímos na festa até amanhecer e só voltamos, acompanhando o barco do prefeito, depois que a "cobra grande" (sucuri), em seu passeio pelo rio, acabou de passar pelo local. Pesquisar a Amazônia é aventura. Tem que ter disposição para tudo.

O GLOBO - O que a senhora tem pesquisado agora? 
BERTHA BECKER - Passei três anos com um grupo de alunos pesquisando as cidades amazônicas para analisar surtos econômicos e relacionar com surtos democráticos ou polítcos. Este projeto está sendo realizado junto com uma universidade na Inglaterra. Analisamos mais profundamente a história de cinco cidades - Manaus, Santarém, Imperatriz, Belém e Parintins - concluimos que só houve um surto econômico com a exploração da borracha, no século XIX. Ou seja, as cidades que se desenvolveram na região cresce-
ram em função da exploração da borracha e só. Nenhuma se industrializou. As pesquisas estão prontas e agora vou analisar para transformá-la em livro.

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