quinta-feira, 13 de junho de 2013

A URBE AMAZÔNIDA ENTRE A FLORESTA E A CIDADE - o mais novo livro de BERTHA K. BECKER


RESUMO

Por que os núcleos urbanos, tão intrínsecos ao processo de sua colonização, não promoveram o desenvolvimento da Amazônia? A autora reexamina a história das origens das cidades amazônicas à luz das teorias de Jane Jacobs sobre as cidades como motores do crescimento econômico, e de Peter Taylor com respeito às relações entre cidades e destas com os lugares centrais.
A história da Amazônia revela que a região ficou à margem do Estado brasileiro, na dependência das demandas das metrópoles e países estrangeiros, passando por curtos períodos de crescimento seguidos de longos intervalos de estagnação. Se em tempos coloniais a apropriação do espaço amazônico pelos europeus seguiu diferentes modelos – catequização por missionários portugueses e espanhóis; fundação de aldeamentos para exportação de drogas do sertão colhidas por indígenas, seguida de intensificação do comércio e urbanização (Portugal); conquista da terra e busca obsessiva por ouro (Espanha); fundação de colônias agrícolas e cooperação com grupos indígenas (Holanda) – em épocas contemporâneas o Estado brasileiro favoreceu a expansão da fronteira agrícola do Sudeste para ocupar a Amazônia, que ocorreu com a formação contemporânea de uma fronteira urbana de imigrantes. Por sinal, o Estado brasileiro historicamente têm-se caracterizado pela implementação de uma geopolítica de controle territorial da Região Amazônica, criando novas instituições administrativas (vilas, cidades, capitais) sem fomentar o avanço social.
O trabalho novo na acepção de Jacobs, fundamento do dinamismo urbano e da expansão econômica, emergiu na Amazônia do trabalho velho representado pelo conhecimento e experiência tradicionais dos povos indígenas, conforme adaptado pelos europeus. Consistia numa combinação de novas maneiras de apropriação da terra, de gerenciamento e logística do escoamento dos fluxos exportadores da droga do sertão: a novidade não estava no produto, mas na sua escala de exploração, instituindo-se novas divisões sociais (escravos, imigrantes rurais) sem progressos distributivos. Entretanto, os vários surtos econômicos que ocorreram nos principais núcleos da região não resultaram em dinamismo urbano ou de expansão porque não conduziram à mudança de conteúdo, estrutura ou complexidade da economia.
Da mesma forma, as redes de cidades que definiriam um fluxo comercial que expandisse a economia regional através de uma substituição de importações não funcionaram na Amazônia porque ocorreu uma relação de subordinação hierárquica às demandas externas das metrópoles mundiais. O capitalismo industrial, que determina a expansão ou retração de determinados produtos e áreas, estimulou surtos súbitos e abruptamente interrompidos que não permitiram a consolidação do crescimento efêmero gerado: ocorreu, por exemplo, com a borracha, a juta, o pau-rosa e a extração mineral. Também contribuíram para a debilidade da economia regional um mercado doméstico fraco e a perpetuação de desigualdades causada pela ausência de políticas públicas que promovessem justiça social.
As poucas cidades dinâmicas da Amazônia devem essa condição ao comércio associado à circulação, aos recursos e a privilégios políticos, e se destacam pela criação de trabalho novo industrial (Manaus), legado de um ou vários surtos (Rio Branco, Manaus, Santarém e Belém), geopolítica estatal (Rio Branco, Imperatriz), indústria cultural (Belém, Parintins) ou estimulo resultante da criação de universidades (Santarém). Em núcleos pequenos e numerosos, a cultura e o saber indígena e caboclo e os grupos camponeses que trabalham na floresta com produtos não madeireiros, formam um contingente diferenciado e resistente, de características próprias. Mas a região ainda se ressente da falta de cadeias produtivas completas que estruturem e integrem os setores de produção, havendo o predomínio da economia informal e grande dependência do Estado brasileiro.
É urgente um novo padrão de desenvolvimento regional, capaz de melhorar as condições de vida das populações da Amazônia e superar as ameaças à sua sustentabilidade. O aproveitamento da biodiversidade frente às crises energética, climática e econômica releva a importância da floresta. Constituem novas e promissoras estratégias o mercado de carbono e outras medidas preservacionistas centradas em biomas, a atribuição de valor econômico compatível com commodities à floresta em pé, o reconhecimento do zoneamento natural dos tipos de vegetação, a recuperação das cidades como nós logísticos das redes e a criação de cadeias produtivas completas.

ABSTRACT

            Why is that the urban nuclei, so intrinsic to the process of its colonization, did not promote the development of Amazonia? The author reviews the history of the origins of Amazonian cities in light of Jane Jacobs’ theories on cities as drivers of economic growth, and Peter Taylor’s ones with respect to the relationships between cities and between these and central places.
            The history of Amazonia reveals the region remained aside from the Brazilian State, depending on the demands of metropoles and foreign countries, going through short periods of growth followed by long intervals of stagnation. If in colonial times the appropriation of the Amazonian space by Europeans followed various models – proselytization by Portuguese and Spanish missionaries; establishment of settlements for exporting drugs from the wilderness collected by indigenous people, followed by an intensification of commerce and urbanization (Portugal); conquest of the land and obsessive search for gold (Spain); establishment of agricultural colonies and cooperation with indigenous groups (Dutch Empire) – in recent times the Brazilian State promoted the expansion of the agricultural frontier from the Southeast in order to occupy Amazonia, which happened about the same time as the formation of an urban frontier of immigrants. Indeed, the Brazilian State has historically been known for implementing a geopolitics of territorial control of the Amazonian Region, creating more and more new administrative institutions (villages, towns, capital cities) without furthering social advance.
            In Amazonia, new work as defined by Jacobs – the basis for urban dynamics and economic expansion – was built on the old work represented by traditional knowledge and experience of indigenous peoples, as adapted by Europeans. It was a combination of new ways of land appropriation, management and logistics of the export flow of drugs of the wilderness: the novelty was not in the product, but in its level of exploitation, as new social divisions (slaves, rural immigrants) were established without distributive advances. However, the various economic surges in the main nuclei of the region did not result in urban dynamics or expansion because they did not lead to changes in the content, structure or complexity of the economy.
Likewise, the city networks that could define a commercial flow that expanded the regional economy by means of import replacement did not work out in Amazonia because of a relationship of hierarchical subordination to the external demands of world metropoles. Industrial capitalism, which determined the expansion or retraction of given products and areas, has stimulates sudden and abruptly interrupted surges that did not allow for the consolidation of the generated short-lived growth: this happened, for instance, with rubber, jute, rosewood and the mining industry.  Also contributed to the general weakness of the local economy a puny domestic market and the perpetuation of inequalities caused by the lack of public policies promoting social justice.
The few dynamic cities in Amazonia owe that condition to the commerce associated to traffic, resources and political privilege, and can be characterized by the creation of industrial new work (Manaus), the legacy of one or more surges (Rio Branco, Manaus, Santarém and Belém), State geopolitics (Rio Branco, Imperatriz), cultural industry (Belém, Parintins) or a stimulus resulting from the creation of universities (Santarém). In small, numerous nuclei, indigenous and caboclo culture and lore and the peasant groups working in the forest with non-wood products form a separate, resilient body with their own specific features. But the region still suffers from a lack of complete productive chains structuring and integrating the production sectors, with a predominance of informal economy and great dependency on the Brazilian State.

A new standard of regional development is urgently needed, one capable of improving the life conditions of Amazonian populations and overcoming the threats to their sustainability. The utilization of biodiversity to face the energy, climate and economic crises points out to the importance of the forest. There are new and promising strategies such as the carbon market and other conservationist measures centered on biomes, the attribution to the standing forest of an economic value compatible with that of some commodities, the recognition of the natural zoning of vegetation types, the recovery of cities as logistical knots in networks and the creation of complete productive chains.

Sem comentários:

Enviar um comentário